Quem nunca ouviu dizer: “Meu filho é muito dependente!” Ou então: “perdi o controle sobre meu filho!” É comum ver nas escolas os professores dentro dos processos de avaliação, registrarem comentários como: “demonstra insegurança” ou então: “dificuldade em cumprir regras e combinados”. Sim, esses são fatos muito comuns. Mas o que acarreta essa tão incidência entre esses dois extremos? Como podemos contribuir para a construção da autonomia em nossas crianças? Como encontrar o equilíbrio entre a dependência e a indisciplina e a falta de limites? Para refletir sobre esse assunto, é preciso compreender as fases pelas quais, a criança passa até chegar a autonomia.
Dentro de um processo evolutivo natural, a criança vivencia a Anomia, fase em que o bebê se mostra super dependente, as regras e limites só existem para o adulto que dele cuida. Em seguida, temos a Heteronomia, nessa fase, a criança já reconhece limites e regras, mas ainda depende do adulto, espera por ele. Por fim, temos a Autonomia, a fase tão almejada, onde o indivíduo tem a consciência das regras e limites propostos, reflete sobre elas e decide cumpri-las. O ser humano autônomo é aquele que se mostra seguro na tomada de decisões por que aprendeu a refletir sobre, antes de decidir.
Não é possível estudar o desenvolvimento dessas fases, sem considerar a sociedade em que se está inserido e o ambiente familiar em que se desenvolve. Pais e mães brasileiras, tiveram na fase da Heteronomia, o estímulo do medo e da ameaça. Aprenderam a depender desse tipo de pressão para aderir a um comando. Sem a reflexão, não sabiam de fato porque obedeciam. A falta dessa clareza, estimula a indisciplina e a quebra de regras e limites. Hoje, o autoritarismo já não domina tanto a técnica de educar. Vivenciamos um ambiente familiar onde as ações são negociadas. Porém, percebe-se que, ante a ausência do autoritarismo, não se definiu ainda uma proposta substituta. Isso é preocupante, pois, numa sociedade consumista, rápida em todos os sentidos, as negociações correm o risco de não serem monitoradas adequadamente e assim, não surtem o efeito proposto. A autoridade é sem dúvida, o fator necessário para substituir o autoritarismo do passado. Para se estabelecer autoridade, é preciso que, dentro do ambiente familiar haja o “olhar estruturante”. Este corresponde ao indivíduo que estrutura a vida da criança, coordena, acompanha, determina. Não se constrói autonomia, sem o reconhecimento desse olhar por parte da criança. Este é o passo fundamental. Tendo estabelecido esse vínculo, o caminho para a autonomia fica mais acessível. O próximo passo, é construir situações favoráveis para que a criança possa refletir e tomar decisões. Para cada situação, é preciso propor reflexão, questionamentos, identificar conseqüências e em seguida, deixar que a criança selecione a opção certa. Ao invés de dizer: você não vai! Questione: por que você quer ir? O que vai encontrar lá? Quais as perdas e ganhos dessa viagem? Conclua mostrando que ao decidir assumimos as consequências. A criança precisa sentir que seu responsável confia nela e no seu potencial de escolhas acertadas. Essa não é uma conquista fácil, pois, não se pode menosprezar o inimigo da sociedade atual: a falta de tempo, que milita contra a construção de indivíduos autônomos e saudáveis. Uma autoridade não se estabelece dentro de uma família com um sistema presencial frio que só cria sansões. Portanto, torna-se urgente, repensar as prioridades familiares. É preciso construir rotinas saudáveis e que em algum momento do dia, essas rotinas se cruzem para a reflexão e diálogo, para que hajam as trocas de experiências, afim de que se estabeleça vínculos de confiança. A super valorização do trabalho, do dinheiro, também militam contra o desenvolvimento da autonomia. Já se ouviu a frase: “O ter tem sido mais importante que o ser”, mas nos dias atuais e com os diagnósticos realizados dentro do ambiente escolar, já é possível afirmar: “o investimento excessivo no ter impede o indivíduo de ser de forma efetiva e autônoma”. Para cada investimento profissional faça também um investimento familiar! Mantenha o equilíbrio entre o ter e o ser. Construa uma identidade familiar favorável à autonomia. Só assim será possível garantir vôos saudáveis para os nossos pássaros queridos.